Desde
dezembro que cientistas e médicos de todo o mundo reúnem esforços para combater
o novo coronavírus. Cinco meses depois e com perto de 2 milhões de infetados, é
praticamente unânime que só uma vacina poderá pôr fim à doença. Mas, o que a
ciência sabe nesta altura será suficiente para travar a pandemia?
Nunca em tempo algum a ciência se uniu como agora para
apresentar uma resposta global desta natureza. E, embora as fronteiras entre os
países se mantenham fechadas, a verdade é que a colaboração internacional entre
cientistas tem rompido essas barreiras físicas. Praticamente, todas as outras
investigações estão nesta altura paradas devido ao distanciamento social e aos
bloqueios que naturalmente se impõem durante o teletrabalho. Hospitais,
laboratórios, e bancos de dados genéticos multiplicam diariamente os seus
esforços para apresentar rapidamente uma resposta que é cada vez evidente que é
urgente.
É certo que esta colaboração científica e médica não é nova. No
entanto, a Covid-19 fez soar os alarmes dentro da comunidade científica como
nenhum outro surto o tinha feito antes. Isso reflete não apenas a virulência da
doença, como as reais dimensões do problema que, ao contrário de muitos outros
na história, não está apenas circunscrito a uma zona ou até região empobrecida
do globo. Trata-se efetivamente de uma ameaça à escala global.
Esta poderá ser uma conquista extraordinária para a ciência. No
entanto, impõe-se uma outra questão: será que as descobertas científicas sobre
o novo coronavírus são nesta altura suficientes para terminar com esta
pandemia?
De onde provém e como surgiram os primeiros casos de
infeção em humanos?
É quase certo que o vírus responsável pela Covid-19 (Sars-CoV-2)
tem origem nos morcegos. No entanto, as dúvidas sobre o animal que terá
infetado os primeiros seres humanos mantêm-se, embora os pangolins sejam a
hipótese que reúne maior consenso, apesar de não serem portadores naturais do
vírus e, por isso, terem alegadamente atuado como agentes intermediários do
contágio.
Segundo as últimas pesquisas, os morcegos são capazes de emitir
uma feroz resposta de imunidade contra o vírus, o que obriga o Sars-CoV-2 a
replicar-se rapidamente pelo organismo a fim de superar a eficácia das defesas
imunológicas desta espécie. Isso faz dos morcegos um reservatório natural da
doença e eleva a ameaça de transmissão. No entanto, o grande problema está no
sistema imunológico dos mamíferos (incluindo a espécie humana) que é incapaz de
apresentar uma resposta imunitária tão eficaz como a dos morcegos.
Como se propaga o novo coronavírus?
O contágio ocorre sempre a partir do contacto direto com
partículas de ar ou saliva infetadas. Uma vez inaladas, essas partículas acedem
facilmente às células das vias respiratórias que apresentam um grande número
de recetores (ACE-2) responsáveis por deixar o vírus entrar no
nosso organismo. Segundo os últimos estudos, o Sars-CoV-2 possui
na sua superfície uma proteína (spike) que bloqueia esses recetores (ACE-2),
permitindo ao vírus reproduzir-se rapidamente. Surge então a resposta
imunológica do nosso corpo que logo produz anticorpos contra o novo coronavírus
e, na grande maioria dos casos, interrompe este processo. É precisamente o caso
dos doentes assintomáticos – pacientes infetados sem sintomas.
No entanto, porque há pessoas a morrer? Em alguns casos,
nomeadamente nos grupos de risco (idosos, diabéticos, asmáticos ou hipertensos)
o vírus pode causar problemas graves, sobretudo depois de atingir o sistema
respiratório e infetar os plumões – ricos em células com recetores ACE-2.
Muitas dessas células serão destruídas e, nesse caso, os pacientes tem quer
receber tratamento nas unidades de cuidados intensivos (UCI).
Pior ainda são os casos em que o sistema imunológico entra
verdadeiramente em ação, direcionando para os plumões células antivirais – num
processo conhecido como tempestade de citocinas – que acabam por resultar numa
inflamação. Este problema pode ficar fora do controlo se o sistema imunológico não
abrandar a sua resposta. Nesse caso, pode mesmo levar à morte dos doentes. Os
investigadores desconhecem ainda o motivo que conduz o sistema imunológico
humano a responder nesta medida (com uma tempestade de citocinas), no entanto,
acreditam que a vulnerabilidade de algumas versões dos recetores celulares
ACE-2 faça aumentar a resposta imunitária.
Se formos infetados estamos protegidos para o resto
da vida?
As últimas análise a doentes infetados com a Covid-19 indicam
que existe um nível razoavelmente alto de anticorpos neutralizantes presentes
na corrente sanguínea. É certo, por isso, que os pacientes infetados tenham
proteção contra futuras infeções, no entanto isso não significa que estes
doentes sejam imunes à doença para sempre. Aliás, os virologistas acreditam
mesmo que a imunidade contra o novo coronavírus tem uma validade relativamente
curta, no máximo de dois anos, o que corresponderia a um período de tempo
semelhante aos outros coronavírus como os responsáveis pela SARS (Síndrome
Respiratória Aguda Grave) e pela MERS (Síndrome Respiratória do Médio Oriente).
A virulência da Covid-19 pode ter-se alterado?
Nesta altura, as opiniões estão divididas. Alguns investigadores
acreditam que o novo coronavírus tornou-se menos mortal. Outros argumentam que poderá
ter sofrido mutações que o tornaram mais letal. Uma coisa é unânime para todos,
só o desenvolvimento de uma vacina poderá terminar com a pandemia da Covid-19.
Quando chegará a tão aguardada vacina?
Na última semana, a revista Nature revelou que neste momento estão em curso 78
projetos para uma vacina contra o novo coronavírus e
outros 37 em desenvolvimento. Entre estes projetos está o programa lançado pela
Universidade de Oxford, nos EUA, que se encontra em fase de testes, duas
empresas norte-americanas de biotecnologia e três laboratórios científicos na
China. Os cientistas acreditam que ainda este ano, muitos projetos passarão à
fase de testes em humanos.
Esta resposta notável da comunidade científica mundial cria
assim fortes esperanças de que a vacina contra a Covid-19 pode ser desenvolvida
num prazo mais curto do que aquele que estava previsto. No entanto, deve ser
tido em conta que este tipo de processos envolvem estudos rigorosos de
segurança e eficácia que por vezes prolongam-se durante meses ou até anos.
in Visão Saúde – 18/04/2020
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